SUICÍDIO ASSISTIDO
11/05/2018 09:54
Cientista David Goodall morre aos 104 anos por suicídio assistido
Australiano viajou à Suíça para realizar o procedimento após ter o recurso negado .
GENEBRA - O cientista britânico David Goodall, de 104 anos, morreu nesta quinta-feira, 10, por volta das 12h30 (7h30 em Brasília) após se submeter a um procedimento de suicídio assistido. Ele viajou à Suíça para fazê-lo, pois teve o recurso negado no país onde havia se radicado, a Austrália, segundo a fundação Exit International, que o ajudou no procedimento.
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David Goodall disse nesta semana que cogitou se submeter ao procedimento depois que sua qualidade de vida começou a se deteriorar Foto: Georgios Kefalas/Keystone via AP
“Às 12h30 de hoje (ontem), o professor David Goodall, de 104 anos, morreu tranquilamente na Basileia por uma injeção de Nembutal (barbitúrico sintético normalmente usado como sedativo)”, escreveu em no Twitter o médico Philip Nitschke, fundador da Exit International. A maioria das pessoas que recorre à organização, fundada em 1997, é idosa.
O cientista, descrito pela fundação como seu primeiro membro, disse nesta semana que pensou sobre esse tipo de suicídio por cerca de 20 anos, mas só cogitou para si mesmo depois que sua qualidade de vida começou a se deteriorar. “Os idosos deveriam ter o direito de decidir isto por si mesmos”, declarou ele, em entrevista coletiva na véspera do seu planejado suicídio. Goodall nasceu em Londres em 1914, mas morava na Austrália desde 1948, onde lecionava na Universidade de Melbourne.
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Ele sabia que uma última entrevista seria mais um mecanismo para ajudar a divulgar a causa. O cientista, que reclamava dos constantes flashes dos fotógrafos, respondeu a todas as perguntas, ainda que um problema auditivo tenha dificultado a pronta compreensão de algumas delas.
Goodall falou ainda sobre sua falta de mobilidade para viagens ao interior do país – o que apreciava bastante –, restrições médicas e a lei da Austrália, que o proibia de tirar a própria vida. Apesar de suas queixas, ele não sofria de nenhuma doença terminal.
O botânico, que publicou extensamente em revistas científicas, transformou-se em ativista do suicídio assistido, proibido em seu país, exceto no Estado de Victoria, que o legalizou recentemente, mas de modo muito restrito e só a partir de 2019.
No seu encontro com os jornalistas, Goodall se mostrou surpreso pela cobertura midiática. “É a minha própria decisão. Quero pôr fim à minha vida e estou agradecido que isto seja possível na Suíça.” Ele já havia tentado suicídio no seu país. “Seria muito mais conveniente se tivesse sido capaz. Mas infelizmente falhei.”
Partida.Nesta quinta, o suicídio de Goodall foi presenciado por diversos parentes e precedido por procedimentos formais que visivelmente frustraram o cientista: “O que estamos esperando?” Sua última refeição foi o tradicional fish and chips (peixe com batatas fritas), e o diretor Nitschke o ajudou a organizar a execução da 9.ª sinfonia de Beethoven para ser tocada durante a sua morte, um pedido espontâneo de Goodall.
“A infusão começou a pingar quando ele ativou o processo – ele mesmo tinha de iniciar – após responder a questões sobre como ele estava, onde ele estava e o que ele estava prestes a fazer. Ele respondeu a todas as perguntas com grande clareza”, disse Nitschke. “Suas últimas palavras foram: ‘Isso está demorando muito tempo’.” Até o último momento, ele tinha a opção de se arrepender e cancelar o procedimento.
Colegas elogiaram sua carreira. “Era brilhante e inventivo”, disse Robert Russon, professor da Universidade de Utah (EUA). Questionado sobre o seu legado, Goodall demonstrou paradoxal sentimento de incompletude e satisfação: “Há muitas coisas que gostaria de fazer, claro, mas é muito tarde. Estou feliz em deixá-las incompletas”. ESTADÃO 11/05/2018
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